segunda-feira, 21 de outubro de 2013

fios de sutura

teu sorriso
rompe a minha cabeça.
e não sou mais nada:
apenas instintos.
es a face do anjo em minhas mãos,
o corpo do diabo em minha cama.
doces olhos,
infernais quadris, gentis.
tu es como eu:
solta, desgarrada.
e por isso, nos encontramos.
somos nada do mesmo.
afetados a pouca coisa.
suicidas:
compartilhando o modus operandi:
somos sangue!
especialistas em mentes.
em duas mentes.
minto?
mentes pra ti.
minto pra mim.
e o que há?
já não sei.
apenas vou ficando, vou ficando.
na esperança de que faças dessa coisa,
que já não mais ouso chamar de "meu coração",
algo melhor que um pedregulho vulgar.

H. L. C.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

menina rabiscada

os olhos do brejeiro
entram nos olhos dela,
e fazem amor
e uma canção de almanaque,
dessas bobinhas,
feito chocolate,
ou qualquer uma dessas outras coisas simples e
com gosto e pele de nectarina,
fruta bendita, suculenta e matinal,
ousada como o sexo explícito
de duas-mãos-dadas atravessando a rua,
meus olhos,
meus poros,
e uma nectarina nua,
desfilando com o seu vestido de chita,
jamais cobrindo suas pernas cruas,
magra,
obscena,
atrevida,
breve,
sem greve,
quadris sem descanso,
impiedosa!

H. L. C.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

o que mata, mas é bom

subindo o morro,
com Isabela.
de manhazinha,
a favela.
entrando nos corredores de Mangueira,
de mãos dadas com Cartola,
com Isabela.
de manhazinha,
antes do barraco,
na padaria,
com tutu!,
tem leite,
tem pão,
tem café.
lá embaixo, o maraca.
lá depois, a estação.
e a molecada já vai gingando a ladeira.
alvorada com Isabela,
encrenqueira.
de vestido branco,
e lábios carnudos,
que adora boteco,
que diz que no morro tem mais cerveja que pedregulhos.
Isabela, que tem olhos mimosos
ao velar o meu sono,
que tem corpo tão quentinho.
e de gênio ruim...
por suas pernas,
houve o dia em que estive em Mangueira,
e esqueci-me da maloca que deixei na Moca.

H. L. C.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

diferente e igual

altos na noite.
os pés, em sorrisos.
desenhando pegadas alegres,
na areia chuvosa da praia.
doces crianças,
em dois,
contentes,
repetindo,
baixinho,
os mesmos versos,
da mesma canção.
ela é uma pequena Piaf,
de traços elegantes.
eu, um tonto em construção.
areia encharcada,
boa pra rabiscar
traços livres,
cifras,
nossos rostos,
códigos secretos.
diferentes que se atraem.
ela gosta de sons,
e eu gosto de brincar de brincar.
ela tem andado colada a um livro de um autor francês.
quanto a mim,
comprei régua e compasso.
vento forte,
madrugada chuvosa,
seus cabelos negros,
luminosos,
como ela gosta de dizer:
"mega molhados!",
torcendo o nariz para não gripar,
louca varrida,
de olhos serenos,
arquiteta,
de um tonto em construção.

H. L. C.


domingo, 6 de outubro de 2013

ensaio a dois

minha garota ainda tem discos,
minha garota ainda chora,
minha garota ainda sabe beijar.
minha garota anda por aí.
e hoje nós vamos a um bar.
nós estamos num bar!
sim!
minha garota sabe um jazz
e hoje ela vai solar.
minha garota tem risadas,
muitas risadas!
toca piano
e quer ensinar-me a dançar.
minha garota tem pelos pubianos...
minha garota gosta de violoncelo,
ela não para de sonhar.
e eu não a censuro,
não sou bobo!
minha garota já memorizou muitos poemas.
minha garota tem lábios lindos.
e olhos grandes e atrevidos.
e hoje estamos num bar.
mas aqui não se pode falar.
só a música...
minha garota tem manias.
descansa o queixo no meu ombro,
sinto ela estremecer
pois a orquestra para e
permanece apenas o violoncelo...
agora volta o piano,
num balançar.
minha garota é sensual...
e hoje ela vai solar.
está amanhecendo.
olho para as pernas dela.
minha garota tem um corpo dos diabos!
mas eu não a censuro.
minha garota ainda tem discos!
ainda sabe chorar.
está amanhecendo...
minha garota sabe cozinhar.
está amanhecendo...
ela tem pelos pubianos!
minha garota tem um Duke Ellington
e também tem duas garrafas de uísque!
eu vou levá-la para casa.
sim!
minha garota tem me ensinado a dançar...

H. L. C.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

nós, os escaramujos

nosso encontro de sempre.
café da manhã, às sete:
Panificadora Marina.
café-preto, pão fracês com manteiga;
café-com-leite, dois pãezinhos de queijo, quentes.
nosso jornal.
impaciente, reclamo de um ou outro caderno,
ela sorri pra mim
e coloca a mão sobre a minha.
continua sua leitura,
de repente, pisca o olho
e saca da bolsa os óculos novos,
não contemos a gargalhada.
pergunta-me se são engraçados.
digo-lhe que são imensamente ridículos.
finge cara de triste e faz-me careta,
abre um lindo sorriso e me beija.
estamos atrasados!
Diz que é o seu dia de pagar a conta.
dou de ombros.
na saída, diz que sentirá falta da panificadora marina.
e eu concordo.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

pés namorando

final de tarde, e o sol se deitando.
os dois na sacada,
nas duas grandes cadeiras de ferro,
sentados juntinhos,
os pés namorando, sobre a pequena banquinha.
à mesinha, nosso "semi seco" e taças manchadas,
sua tábua de queijos.
um afago na mão,
um carinho na face,
um traguinho no cirgarro,
é Billie Holiday cantando,
é o ravioli no fogo,
é o celular tocando,
dois pés namorando,
duas bocas beijando,
é sua face que cora,
já de poros abertos,
é o ravioli no fogo,
são nossos corpos queimando!
as estrelas já no céu,
as buzinas do trânsito intenso das 18 horas,
e é ela que chora, sempre,
no auge do prazer!


H. L. C.

Sutilezas

Hoje, es tu.
Com teu vestido florido,
entrando pela minha porta,
trazendo um sorriso de domingo.

Es tu, chegando mais perto,
hálito doce,
cheiro de primavera.
Delicada, alegria de criança grande
mas quão fêmea, quão atrevida...
quantas gargalhadas,
nossas piadas,
nossos beijinhos,
nosso cantinho.
chega a tardinha,
o almoço já tarde,
janta quentinha,
depois, cama tão boa!
cheirinho de você, no "hedredom" novo...

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Gracejo

Tenho um cachorro chamado
Onomatopeia.
Pela manhã,
ele acorda latindo:
"Happy! Happy! Happy!"

domingo, 30 de junho de 2013

Algum Lugar (ou poema para uma tonta)

Chamou-me ao ouvido.

Encontramo-nos.

Duas palavras trocadas,

um capuccino dividido.

E seus olhos contam-me

que ainda sou, dentro dela,

o som de um singelo violino

que toca.


H. L. C.

terça-feira, 28 de maio de 2013