segunda-feira, 31 de agosto de 2015

promessas para Mary

pequena Mary,
nos mudaremos para uma cidade
chamada John Lee Hooker.
Lá, eu lhe darei de presente uma casa
com varanda engraçada
e uma guitarra cravada de verbenias,
bartiras e viridianas.
pequena Mary,
você poderá pintar telas com carros-rabos-de-peixe
e cozinhar lentilhas com azeite.
e sempre estenderemos nossos tapetes verdes
por todo o quarteirão
e passaremos as noites de outono
contando estrelas veganas.
ei, pequena Mary,
nunca deixe de acreditar nos discos de jazz,
eles são como noites macias e picantes.
sabe de uma coisa, pequena Mary?
ETs ainda existem.
e aposto que também eles
aprovam os seus cabelos novos e estranhos.
tenho tantas dúvidas, pequena Mary.
e antigamente eu achava cafona o seu óleo de amêndoas.
pequena Mary,
hoje foi como estar na lona,
não sobraram nem os meus
velhos cigarros.
pequena Mary,
eu não devia lhe dizer, mas,
a John Lee Hooker, ufa!, cidade e tanto...
Vamos logo!, lá, sou amigo do rei.

H. L. C.





domingo, 30 de agosto de 2015

Brasil, idos de setembro do ano n. 13

acordar de manhã
e ir comprar pão quente.
pão, que de francês não tem nada,
pão da gente.
no caminho, estudantes, fruteiros,
gente estridente.
nas bancas, os jornais:
"um Pais sem presidente!"
nas janelas das casas,
um tal de bate-panela e
uma infinidade de placas:
"procura-se um suplente.
Palácio do alvorada,
dieta ravena
e grana lavada."

H. L. C.

agridoce, guardanapos e adoráveis terminações nervosas

Quando não há mais o que dizer...
surge o movimento do olhar,
a pintura discreta das mãos unidas;
os poros guiando os passos à vida;
as calçadas unindo-se às avenidas;
os lençóis em alternância improvisada
e os dias dizem "olá!", talvez mais ternos,
rendidos ao milagre dos lábios
de timbres amáveis.

H. L. C.

sábado, 29 de agosto de 2015

rosas em cor de boca

Há uma menina bailarina,
que desenha rosas imensas, por todos os cantos.
Há um vestido colorido, rasgado de amor.
Há um umbigo pequenino,
de onde se bebe vinho e
garrafetes de conhaque.
Há um mar azul
e o café tem preguiça de acordar...

H. L. C.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

pequenas notas

Teus olhos como a tocar piano.
Cansada e com amor.
Na bolsa, uma garrafa de vinho,
duas novidades e
um filme noir.

H. L. C.

da série 'de quando minha casa era o teu ateliê'

terça-feira, 25 de agosto de 2015

de além cá

A funâmbula estica a corda.
Acorda, a sonâmbula,
com as suas jabuticabas
de pernas brancas,
onde eu plantei lagos e aplausos,
onde havia alfaces e avestruzes,
ali, onde cravou-se uma luneta
cercada de hipopótamos...
A funâmbula,
quer-se dizer,
a sonâmbula,
pariu uma linda girafa
a quem eu denominei "M" de além cá.

da série 'de quando minha casa era o teu ateliê'

H. L. C.

o não querer do verbo

os poemas fáceis
iludem as botas da Paloma
ocultam as botas da Paloma
os poemas fáceis
de grilhões enchem
as faces da Paloma
que não querem verbo
que não querem pensamentos
apenas pipoca, num cantinho secreto
apenas o jazz, dum abraço aberto

da série 'de quando minha era o teu ateliê'

H. L. C.


pincéis e outras coisas sem sentido

o non sense me persegue
o  grilo e a lebre
pingos de fechar a porta
retas
compotas
girassol
milhões de idiomas lá
espanto
o sentido
em circular
espirro

H. L. C.