sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Leia a Lápide

Quando eu morrer, quero que leve uma flor ao meu túmulo. Mas não tema, garota, isso não lhe roubará muito de seu tempo. Tome rapidamente um coche de aluguel e siga, sem pestanejar, pela SC-45, na direção norte. À altura do Km 252, verá uma grande e velha placa ostentando ‘Nova Fronteira’, adentre o caminho da placa. Estrada de chão, um pouco maltratada, mas não fará mal, o ar é bom, venta-se bem, ademais o caminho já é quase findo. Em 36 minutos alcançará um velho apiário desativado, ladeado por duas pequenas casas, de uma delas, da cor verde, certamente um assíduo ancião, esquálido, sorridente, lhe abraçará um olhar gentil. Talvez chova. Mais adiante, seu tédio arrependido será cortado por duas crianças atravessando o carro de súbito, o que lhe causará um pequeno susto, mas logo se recomporá. À última parte do caminho nem sofrerá com a distância, dividida entre o aborrecimento que lhe causou o meu pedido e a imagem feliniana do motorista anão que não tira os olhos do seu belo nariz libanês. Aí está, ou aqui estamos... Vê? Lê? Garota esperta... “Recanto dos Estrangeiros”. Peça pra parar. Não deixe que entre com o carro. Precisa descer e ir a pé. ‘Respirar sempre!’ Esse foi o conselho que lhe dei, lembra? Por falar nisso como andam os seus piri-paques com o ar-condicionado do cinema? Às vezes ria-se. No passo 27 achará curioso o nome do lugar, algo meio Camus... Enfim, pensará que se trata de uma bobagem. Sim, quadra 9. Ala 18. Lhe passará pela cabeça o fato de eu nunca ter gostado de cemitérios. Estranha também será a recordação de que da mesma forma tinha grande desprezo por hospitais. Como espera encontrar o túmulo? Siga... reto... direita, direita, direita, direita... gostou da árvore? Cafona não é? Eu também deveras teria achado o mesmo. Ou pior. Eis-me aqui: número 63. E a flor? Flor de rúcula, lembra? E única, apenas uma! agache-se. Buh! Belas agorlas, garota. Mas o que houve com os seus olhos? Leia a lápide. “Wall-e-e-Eva"
Hedre L. Couto.

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